Por Carol Nogueira
A má alimentação das crianças é uma queixa constante, mas, muitas vezes, o problema começa em casa.
Sentada à mesa, a criança enrola, faz cena. A mãe leva um aviãozinho à boca. Não quer. Cerra os dentes, faz que não com a cabeça. O pai conta historinhas. Nada. Finalmente, os dois tentam explicar porque o filho deve comer, mas nenhuma opção adianta. A cena é clássica, e claro, exagerada, mas não menos verdadeira, segundo mostra o estudo Nutri-Brasil Infância, que avaliou os hábitos alimentares de mais de 3 mil crianças de 2 a 6 anos no Brasil.
O pediatra e nutrólogo Mauro Fisberg, que conduziu a pesquisa em parceria com a Danone Research, concluiu que a alimentação das crianças vai de mal a pior. Os dados levantados revelam que elas apresentam carências de nutrientes importantes para o desenvolvimento, como cálcio, e excesso de outros, como sódio. Mas o que os pais podem fazer para ajudá-las? Para responder dúvidas comuns, VivaSaúde entrevistou o próprio Mauro Fisberg, também professor adjunto do departamento de Pediatria na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Por que as crianças se alimentam mal?
Mauro Fisberg: Os erros alimentares poucas vezes são só das crianças. Normalmente, são dos pais ou dos cuidadores. Digo isso porque a criança está sempre exercendo seu papel de desenvolvimento, e os adultos são responsáveis pelas condutas nas quais ela se espelha. Se exemplos forem inadequados, ela não conseguirá fazer de outro jeito. E a sua alimentação não pode ser igual à de um adulto, pois a criança tem necessidades diferentes, que vão de acordo com a idade.
Em quais aspectos elas mais erram?
A maior parte dos problemas ocorre dentro de casa, porque os erros começam nos hábitos e na introdução de alimentos. A transição entre o leite materno e a alimentação saudável é muito difícil, pois falta orientação tanto de profissionais da saúde como da família. É comum que a criança tente manipular os pais, e alguns cedem oferecendo recompensas ("Se você comer tudo, pode brincar na rua") ou castigos ("Se não comer jiló, vai ficar sem televisão"). Atitudes como essas não funcionam. É um círculo vicioso. Você começa com um aviãozinho e chega numa nave espacial.
Quando os pais devem fazer a transição do leite materno para os alimentos?
As normas da Sociedade Européia de Gastroenterologia Pediátrica e Nutrição estabelecem que o melhor período de introdução de alimentos está entre o quarto e o sexto mês, nunca antes ou depois. Nessa fase, ao mesmo tempo em que a criança consegue se adaptar muito rápido aos novos alimentos, os riscos de alergia também são menores, porque ela está em uma condição chamada janela imunológica, ou seja, tem menos probabilidade re reação alérgica e consegue ter uma absorção adequada de nutrientes.
Quais fatores ocasionam a rejeição de certos alimentos?
Normalmente, o problema está relacionado a aspectos comportamentais, que são determinados por uma gama de fatores, como a seletividade natural do paladar da criança, distúrbios de contato familiar (como brigas frequentes ou falta de refeições feitas em família), dificuldade de relacionamento, problemas sazonais (como uma gripe) ou mudanças na rotina. Todos esses casos podem ser agudos e ocasionais, mas se forem crônicos podem gerar complicações no futuro.
O que os pais devem fazer quando isso ocorre?
A neofobia, ou seja, o medo ao novo, é muito comum nas crianças. É por isso que elas rejeitam o que não conhecem, numa tentativa inconsciente de se proteger. Por isso, é preciso fazer a criança experimentar várias vezes o mesmo alimento até que aquilo se torne conhecido por ela. Vale mudar o preparo até encontrar uma forma que a criança se identifique com o gosto e a textura.
E se a criança se recusar a experimentar?
Depende do caso. Ela pode não comer legumes como quiabo e estar perfeitamente bem de saúde. Algumas crianças não comem cronicamente, então, é necessário realizar um tratamento familiar, em que o nutricionista irá buscar a causa do problema, para que possa realizar o tratamento.
Como funciona o tratamento com a família?
Geralmente, orienta-se para cada problema específico. Em algumas casas os hábitos alimentares são péssimos, então é necessário fazer com que todos mudem sua alimentação. Em outras, o enfoque é muito mais comportamental, porque algumas pessoas não têm o hábito de fazer refeições em família. É muito comum a ajuda dos psicólogos.
O que os pais devem fazer com as crianças que devem comer só a sobremesa?
Isso é uma questão de hábito. A criança até pode comer o doce antes do salgado, mas sem exagerar. Ela precisa de uma rotina, de horários e durações estabelecidos para cada refeição, assim fica mais fácil se organizar.
A criança tende a preferir o açúcar e a gordura. Por que isso acontece?
Existe uma explicação fisiológica para que isso ocorra. Na ponta da língua, nós temos a preferência por alimentos doces e no fundo, os amargos e azedos. Então, se eu coloco o alimento na boca pela primeira vez, normalmente sou sensibilizado pelo paladar doce, que é agradável. Se a criança for exposta precocemente a diversos tipos de sabores e preparações, ela vai se acostumando.
Como prepara o alimento para agradar o paladar?
A criança não deve receber alimentos inadequados à sua forma de se alimentar. Aos seis meses de idade ela não está pronta para comer algo mastigável ou que não esteja processado. O melhor é que a mãe ofereça alimentos amassados, porque assim a criança pode identificar o sabor.
Existem ingredientes que devem ser evitados?
Alguns alimentos podem dar alergia, como frutos do mar e crustáceos, então é necessário esperar até que o sistema imune da criança esteja completo, o que acontece, normalmente, até os dois anos de idade.
Fonte:VivaSaúde. Editora Escala, número 78.
sexta-feira, 6 de abril de 2012
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